Gerentes corporativos, que acreditam saber mais que o CIO e criam seus próprios projetos de tecnologia, são um pesadelo para o departamento
Lee Shull é gerente de aplicativos corporativos para a América do Norte da Beiersdorf, fabricante de produtos de beleza, como as linhas de cremes e loções da Nívea. Ele também acumula o cargo de diretor de TI para a região, desde que o vice-presidente de TI pediu demissão, no segundo trimestre do ano passado. “Quando as pessoas precisam que as tarefas sejam realizadas, geralmente, elas recorrem a mim”, comenta.
Bem, nem sempre. Shull preocupa-se com o fato de que seus colegas na área de operações da cadeia de fornecimento assumiram a tarefa de implementar um sistema colaborativo de planejamento, previsão e reposição de estoque, sem, antes, terem submetido tal sistema à avaliação adequada do departamento de TI. A mesma coisa aconteceu com um aplicativo de inteligência de negócios no departamento de vendas. “Parece que alguns setores querem seguir seus próprios caminhos”, avalia. “Estou tentando controlar a situação.”
Boa sorte, Lee Shull. Quer seja por intermédio da experiência, do treinamento ou de uma “osmose” cultural, cada vez mais pessoas nas companhias sabem sobre tecnologia – ou, pelo menos, elas acham que sabem. Embora muitos diretores de TI considerem uma boa coisa que seus colegas, com os quais eles podem conversar abertamente, tenham este conhecimento, para alguns o conhecimento insuficiente é algo perigoso. Executivos sêniores, gerentes das linhas de negócios e até mesmo usuários finais tentam influenciar as políticas de TI ou, pior ainda, querem evitar os CIOs de conseguir que seus projetos ou produtos sejam implantados.
Desde que os computadores saíram dos limites dos antigos centros de processamento, os problemas para os diretores de TI têm sido a atribuição de responsabilidades, a garantia do cumprimento de padrões e assegurar que os sistemas de TI tenham condições de compartilhar os dados que precisam ser compartilhados. Mas, atualmente, o nível de sofisticação da tecnologia nas companhias é mais amplo e profundo. Novas tecnologias, como os softwares como serviço e a Web 2.0, prometem funcionalidades sem as dificuldades usuais – por exemplo, o envolvimento do departamento de TI.
Para os diretores de TI, as implicações dessa tendência não são triviais e se manifestam em uma época de transição: os líderes de tecnologia terão de subir na hierarquia organizacional ou, talvez, descer, conforme preveem muitos observadores. Alguns deles detectam uma nova função com base na ubiquidade da tecnologia. Os CIOs inteligentes apoiam seus colegas mais adeptos da tecnologia, para ajudá-los a progredir com relação às agendas corporativas.
Como evitar o menosprezo em relação à área de TI
O que cada gerente precisa saber
“Os profissionais corporativos em quase todas as funções estão conscientes de que a TI é parte integrante de seu trabalho”, declara Jeanne Ross, pesquisadora no centro de pesquisas sobre sistemas de informação, do MIT. “Hoje em dia, não é possível ter sucesso nos negócios sem ter conhecimento de tecnologia”, complementa John Rough, CIO da DBL Distributing.
Para Rough, trabalhar com um grupo de profissionais tecnicamente experientes, incluindo seu diretor-executivo, significa gastar menos tempo tentando convencer da necessidade de um projeto. Provavelmente, não influi o fato de que Rough trabalha em uma companhia de tecnologia: a DBL é uma atacadista de produtos eletrônicos para consumidores, recentemente adquirida pela Ingram Micro.
“Os executivos estão mais experientes”, comenta Joseph Santamaria, vice-presidente de aplicativos de negócios corporativos da Pitney Bowes. Para ele, não se trata necessariamente de ser melhor ou pior, é apenas um ambiente diferente, no qual a área administrativa está “menos disposta a aceitar fazer acordos” com o setor de TI. Um portal de colaboração que a companhia criou recentemente se originou a partir de uma solicitação da área de negócios. “Os projetos de TI são mais uma exigência do que um incentivo”, define.
A questão é: quem está exigindo e com que intensidade? “Os executivos sêniores experientes em tecnologia podem ser simpáticos e proporcionar o amplo apoio de que um departamento de TI precisa para ser efetivo”, explica Aaron Lapat, um headhunter de profissionais de tecnologia da J. Robert Scott. Eles também podem “interferir” em suas expectativas “ambiciosas demais” com relação a orçamentos, cronogramas e tudo o que a TI pode oferecer, analisa.
Pergunte a Bruce Simons, diretor de TI da USAlliance Federal Credit Union. Simons descreve seu CEO, a quem se reporta, como “relativamente experiente em tecnologia” por ter se envolvido neste setor desde o início de sua carreira. Por outro lado, o diretor-financeiro da companhia não tem nenhuma experiência na área técnica. “Ele conhece somente duas palavras: não gastar.”
O diretor-executivo, o diretor-financeiro, Simons e alguns dos outros executivos formam um comitê que determina as estruturas das taxas para empréstimos e das economias relacionadas a produtos. Todos eles têm suas funções: o trabalho de Simons é apresentar a perspectiva da TI nas reuniões. Ele demonstra o que pode fazer do ponto de vista da tecnologia para ajudar a projetar, implementar e dar suporte técnico a novos produtos. “Algumas vezes, existem desentendimentos”, explica, citando como exemplo as ocasiões em que o CEO acredita que um projeto de TI é simples de ser implementado e não se preocupa sobre como o projeto irá se refletir em toda a organização.
Os executivos seniores veteranos no segmento de TI podem causar outros problemas. “As pessoas que já trabalharam na área aprenderam um pouco de programação daquela época – e acreditam que sabem como projetar um sistema de elaboração de relatórios”, menciona uma diretora de TI de uma grande companhia de produtos para consumidores, que pediu para não ser identificada. Frequentemente ela recebe projetos que não vão funcionar. E o executivo sênior que desenvolveu o projeto não irá pagar por ele a menos que o departamento de TI realize-o do modo como projetou.
“É nesse momento que você precisa ser apropriadamente direto”, relata Russ Edelman, consultor de TI e co-autor do livro Nice Guys Can Get The Corner Office. Os CIOs precisam aprender a educar os executivos de alto nível que possuem algum conhecimento de tecnologia.
Conviver com um líder capaz de apresentar uma segunda opinião é uma habilidade necessária em qualquer cargo. No entanto, mais problemático para a TI são os gerentes que assumem por sua própria conta o controle dos projetos de tecnologia. Liam Durbin, diretor de TI da Heinz North America, acredita que o know-how de tecnologia dos executivos corporativos da atualidade está, em grande parte, em sua experiência adquirida. Eles são “especialistas em dispositivos”, segundo ele, mas, certamente, não têm conhecimento de como uma organização de TI deve operar.
As unidades corporativas que resolvem criar seus próprios projetos de tecnologia são um dos pesadelos recorrentes de Durbin. Recentemente, ele se deu conta do fato de que seu departamento de marketing estava passando por algo chamado de “preparação para o início da era digital”. Ele soube dessa iniciativa e fez o possível para que alguns membros de sua equipe estivessem presentes. “Em longo prazo, a situação teria sido muito mais complicada, caso não tivéssemos nossos profissionais participando”, ressalta. “Não estamos aqui para dizer não, mas, sim, para encaminhar a conversa em direção a algo que podemos fazer.”
O fator “não”
Essa reputação de “dizer não” é um dos fatores que ajudaram a criar a síndrome de “evitar o departamento de TI”. Certas indústrias, como as de serviços financeiros e de assistência médica estão adotando uma abordagem de “bloquear” a TI, principalmente por causa das restrições de regulamentação. Em muitas organizações, as preocupações com segurança e privacidade tornaram os CIOs hipervigilantes quanto a impor padrões e manter os usuários em condições de igualdade.
Todavia, uma companhia ultramoderna está adotando a abordagem contrária, como o modelo do Google, que permite que seus funcionários escolham entre diversos tipos de PCs e sistemas operacionais, e façam o download dos aplicativos que eles quiserem. Mas a TI pode não ter muita escolha: afinal, os funcionários são, em sua grande maioria, especialistas em tecnologia.
A companhia resolve internamente as questões de segurança mais óbvias, fortalecendo a infraestrutura, em vez de bloquear as extremidades, como a maioria das empresas faz. Esse modelo com base na escolha é menos eficiente em custo do que padronizar o hardware e o software para os usuários finais. No entanto, desta maneira o Google obtém uma produtividade um pouco maior de seus profissionais de tecnologia.
Jeffrey Neville, CIO da Eastern Mountain Sports, varejista no setor de equipamentos para esportes radicais, não chega a esse extremo, mas encoraja seus funcionários, especialmente os diretores de nível médio, a experimentarem técnicas e ferramentas de marketing online, tais como as redes sociais e vídeo por IP.
Essa abordagem proporciona o que ele chama de “iniciativa de pesquisa e desenvolvimento distribuídos”, similar ao modelo pelo qual a Procter & Gamble incentiva pessoas que não trabalham para a companhia a apresentarem novas idéias e invenções. Neville diz que considera as capacidades técnicas dos funcionários de sua companhia como uma oportunidade, “não como um desafio ou um problema”.
O desconhecimento da tecnologia apresenta seus próprios problemas para a TI, como nas empresas nas quais as pessoas não têm experiência com tecnologia. Isto as deixa mais vulneráveis aos ‘discursos’ dos fabricantes e torna mais provável que elas comprem um produto que não se adapta aos padrões ou exigências de infraestrutura da companhia.
Colocar a TI em operação não é o suficiente
A base mais ampla do conhecimento sobre tecnologia, seja ele adquirido com a experiência ou não, é um aspecto importante na mudança significativa que vem ocorrendo no que se refere ao papel do CIO. Se eles quiserem adquirir – ou manter – o status de executivos seniores, eles precisam evoluir da condição de “gurus” de tecnologia para a de estrategistas corporativos. “Não podem simplesmente colocar a TI em operação”, descreve Jeanne Ross, do MIT.
Uma razão fundamental para isso é que um número maior de executivos está assumindo mais responsabilidade pelos projetos de TI dentro de seus domínios, como quando o diretor-financeiro implementa um aplicativo para a elaboração de orçamentos ou o departamento de vendas e marketing utiliza um aplicativo de CRM. Isso deixa os diretores de TI com uma opção: manter uma infraestrutura de nível inferior ou avançar.
Jeanne não é a única a observar essa mudança nas responsabilidades referentes à TI. “Podemos verificar isso quando realizamos nossas avaliações de retorno de investimentos (ROI)”, salienta Ian Campbell, presidente da Nucleus Research, consultoria especializada em examinar o ROI de projetos de TI. Campbell diz que ele e seus pesquisadores terminam conversando sobre os projetos de TI e seus resultados cada vez mais com os profissionais do setor corporativo e cada vez menos com o CIO. Outro sinal da mudança, de acordo com Campbell, refere-se aos orçamentos dos projetos de TI, que estão sendo menos incluídos em TI e mais nos orçamentos departamentais. Isso ocorre porque muito freqüentemente é o gerente do setor corporativo quem percebe o valor do projeto de TI e, então, o articula junto ao diretor-executivo.
Richard Dellinger é co-fundador e vice-presidente de desenvolvimento na Adaptive Planning, empresa que comercializa aplicativos de software como serviço para elaborar orçamentos, previsões e relatórios. A Adaptive tem cerca de 200 clientes e vende seu serviço principalmente para diretores-financeiros, controllers, vice-presidentes de finanças e de planejamento. “Quando o departamento de TI se envolve nas vendas, é para verificar a segurança, como o aplicativo está hospedado, como são feitos os backups”, esclarece. Mesmo considerando que os serviços online estão conquistando maior popularidade e importância, Dellinger garante que as companhias sempre precisarão das organizações de TI para se focalizarem em sistemas legados, como registro geral, bancos de dados e redes.
Esteja ele se engrandecendo ou não, a questão levantada por Dellinger é importante. À medida que a responsabilidade pelos projetos de tecnologia se expande para mais divisões de uma organização, o que fica para a TI é, digamos, o “trabalho pesado”. Mas é necessário que alguém supervisione os processos corporativos, implementados ou modificados por esses novos aplicativos. O CIO é a pessoa que, pela lógica, deve cumprir com esse papel. “Melhor do que ninguém, ele reconhece que as decisões relativas à TI são sobre processos corporativos”, menciona Jeanne, do MIT, que criou um título para esse cargo: diretor de execução estratégica.
Mantenha-se na atividade
Existem etapas que os CIOs podem realizar, de imediato, para impedir que os outros departamentos evitem recorrer ao de TI. Um instrumento ineficiente é apelar para o diretor-financeiro implementar uma política corporativa destinada a ditar que todos os contratos referentes à tecnologia precisem ser assinados em conjunto por um representante de TI. Um método mais construtivo é manter a divisão de tecnologia estreitamente relacionada com o setor corporativo.
Para os diretores-executivos, que já estão sobrecarregados, desenvolver relacionamentos pode ser uma atividade demorada. “Continuam aumentando as expectativas quanto ao que pode ser fornecido”, afirma Frank Modruson, diretor de TI da Accenture. Contudo, Modruson não se sente intimidado: sua companhia está imersa em TI. Em uma reunião do seu comitê de tecnologia, realizada recentemente, Modruson descobriu que o diretor de operações financeiras queria conversar sobre “a dimensionalidade dos dados”.
Em vez de ficar exasperado, Modruson sentiu-se revigorado. “Se você pode acreditar nisso, então, estamos tendo uma conversa sobre arquitetura de dados com os profissionais corporativos”, comemora. A vantagem do CIO é que os executivos corporativos se tornam aliados que podem ajudar a “fazer a companhia progredir melhor e mais rapidamente”. Mas você não pode permitir que eles desanimem.
Sendo conquistada da forma correta, a condição de ter aliados em todos os setores da companhia pode melhorar muito a reputação da divisão de TI. Michael Pellegrino, vice-presidente de TI da Fujifilm, acredita que seu grupo tem realizado um bom trabalho. “Existem poucas atribuições da TI sendo realizadas fora. Na maioria das vezes, eles recorrem primeiramente a nós.” Por exemplo, recentemente, uma das divisões de vendas se dirigiu à TI para solicitar a implementação de um “CRM mais leve”, o que na verdade era uma ferramenta instalada sobre o Outlook. O grupo de vendas já havia analisado a ferramenta. “Desde que a divisão esteja disposta a assumir os custos, este é um excelente projeto”, ele acrescenta. “Eles sabem o que querem, e nós temos condições de atender às necessidades dentro de um prazo razoável.”
Entretanto, a programação que Pellegrino estabelece para esse projeto – “semanas ou meses” – poderá testar a paciência de seus gerentes conhecedores de tecnologia. Provavelmente, seria melhor não testar demais a paciência deles, Michael.
por John Soat, da InformationWeek EUA
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